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Há uma crença generalizada de que o resultado da eleição será função do resultado da Copa: se o Brasil for campeão, Dilma será reeleita; se não for, o PT sairá do poder. Muitos torcem contra a seleção (o que é seu direito, naturalmente) na esperança de mudar de governo. Alguns até cogitam que o governo tenha comprado os resultados da Copa.
Perdoem-me, amigos, mas que tolice!
Para desmentir a teoria, basta comparar as Copas passadas com as eleições do mesmo ano. Houve apenas um ano em que a situação ganhou após a seleção sagrar-se campeã. Se a vitória seleção tem influência sobre a eleição seguinte, tende a prejudicar a situação – o que não faz sentido.
Ano | Brasil campeão | Situação ganhou |
1994 | Sim | Sim |
1998 | Não | Sim |
2002 | Sim | Não |
2006 | Não | Sim |
2010 | Não | Sim |
Esta hipótese não advém da realidade, mas sim de uma visão simplória do eleitorado. Nesta visão, grande número de eleitores seria tão desligado da política que delegaria suas decisões eleitorais à única coisa que lhe interessa: o futebol. Este eleitor hipotético – conhecido como “despolitizado” – é tão ignorante da política que não é capaz de considerar mais nada em seu voto.
Isto é impossível, porém, porque ninguém pode ser isolado da política. Todo mundo é afetado pela segurança pública, fatores econômicos, saúde e educação públicas, transporte coletivo, infraestrutura. Não existe razão para o eleitor valorizar o resultado da Copa mais do que tudo que o afeta diariamente. Mesmo que se considere este eleitor tão ignorante e isolado que não possa assistir a um telejornal ou conversar com outras pessoas – uma situação bem improvável – sua própria vida é tão profundamente afetada por decisões políticas que, ainda assim, ele já teria uma boa base para suas decisões. De fato, como vários – mas não todos – postuladores do “eleitor despolitizado” não dependem (e às vezes nunca dependeram) de saúde, educação e transportes públicos, o tal “eleitor despolitizado” provavelmente terá muito mais conhecimento empírico sobre esses temas do que seus acusadores.
Considerando o estado lamentável da saúde, educação e transportes públicos, cabe perguntar por que, então, estes eleitores votariam em mais do mesmo. É impossível saber as motivações de todos os eleitores, mas algumas razões podem ser imaginadas.
Por exemplo, a economia. Embora eu mesmo seja bastante crítico das atitudes do governo na área, ela vai bem no que importa e é evidente para a maioria das pessoas. Apesar de certa redução na velocidade, a taxa de desemprego continua caindo. A inflação incomoda e o crescimento da renda média cai, é verdade, mas a renda continua subindo, e a inflação (que afeta mais o setor de serviços) está longe de afetar drasticamente o dia-a-dia.
O “eleitor despolitizado” também pode atribuir fatores diferentes a entes diferentes da federação. Se o ônibus está ruim, ele pode decidir por punir o prefeito, não a presidente; se a escola do filho vai mal, se oporá ao governador. De fato, os governadores tiveram avaliações piores que as de 2010. A divisão feita pelo eleitor pode ou não ser correta, mas existe.
Vale lembrar também governantes não são avaliados pelo quanto a situação está ruim, mas sim pelo quanto ela melhorou. Se o eleitor perceber que a situação está ruim, mas notavelmente melhor do que já foi, pode votar no governo atual. Eu, de fato, acredito que muita coisa melhorou – devido a esta administração, a administrações passadas e a fatores alheios – então não me estranharia que muitos votem por esta razão.
Algumas razões do opositor podem ser também as razões do voto pela continuidade – basta se pôr na posição de outra pessoa. Você pode achar que o Mais Médicos é uma gambiarra – mas para quem, no interior, não tinha médico nenhum ele pode ser a diferença entre vida e morte. Muitas faculdades favorecidas pelo Prouni podem não ser boas, mas seus cursos são a porta de entrada de carreiras promissoras. O programa Minha Casa Minha Vida pode ter externalidades negativas; ainda assim, muita gente saiu do barraco insalubre para a casa própria devido a ele. Estas mudanças revolucionam a vida das pessoas: é natural que guie o voto de muitas delas. O opositor pode apontar inúmeras falhas nestes programas, mas toda crítica, por válida que seja, será muito abstrata perante a concretude da mudança.
A Copa também pode influenciar votos – mas de outra maneira. O tão anunciado fracasso não se concretizou; ao contrário, considera-se esta a melhor Copa das últimas décadas. Consequentemente, o governo melhorou sua imagem por ter organizado um evento espetacular. Ademais, a confiança nos que professavam o caos caiu ante o fracasso de suas profecias. Ao invés do apocalipse previsto, vimos apenas soluços…
…até a tragédia de 3 de julho. A queda do viaduto em Belo Horizonte é uma mancha horrível na história desta Copa. Ainda assim, isto não deve afetar muito as intenções de voto país afora. A responsabilidade da catástrofe ainda não foi atribuída (e parece pender para o município). Ademais, este foi um problema isolado – de outro modo, haveria catástrofes nas outras cidades-sede. Mesmo com tão deplorável acontecimento, o saldo eleitoral da Copa deve ser positivo.
A tese de que o campeão da Copa definirá a eleição prejudica acima de tudo quem acredita nela. Leva à desistência do diálogo, ao fechamento em si mesmo. Não precisa ser assim: basta aceitar que pessoas podem ter motivos razoáveis para discordar de seu voto. Uma vez que se aceite isso, o diálogo se torna viável e, aí sim, há a chance de se mudar a opinião alheia – ou de se aprender com ela.
Então, não se preocupe: você pode torcer sem medo pela seleção amanhã e, com sorte, na final. (Ou pode torcer contra, também, se preferir; só não precisa fazê-lo.) O resultado destes jogos não fará diferença real nas eleições. Torcer contra com o objetivo de mudar a política é, perdoem-me, uma tolice: é pensar que fez a diferença quando não mudou a ideia de ninguém. Aceitar este fato tornará o debate muito mais respeitoso e interessante.
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- 8 de julho de 2014 às 10:24:01 [Revisão atual] by brandizzi
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